quinta-feira, 25 de outubro de 2012

O MUNICÍPIO NA HISTÓRIA GERAL





Como este blog foi criado com o objetivo de tratar de assuntos ligados ao Direito Municipal (que inclusive é o título do blog), iria escrever sobre as origens do município. Porém, além dos livros que possuo, existe materiais bons na rede mundial, de forma que vou postar alguns excertos colhidos de alguns artigos de ótima qualidade. Neste trecho escolhido do artigo "O Município na História do Brasil", de Maria Elizabete Marcondes Guimarães, é traçado um panorama histórico da formação do município. Vejamos!


O MUNICÍPIO NA HISTÓRIA GERAL
 
O Município como unidade político-administrativa surgiu com a República Romana que premiava as cidades que aceitavam pacificamente a sua dominação, dando-lhes privilégios privados (jus connubi, jus commerci, etc.) e políticos, que consistiam em permitir que essas comunidades elegessem seus governantes e dirigissem suas cidades.
Os Romanos denominavam essas comunidades de Municipium, que se repartiam em duas categorias, dependendo da maior ou menor autonomia de que desfrutavam (municipia caeritis e municipia foederata), dentro do direito romano (jus italicum).
Segundo Wolgran Junqueira Ferreira:
Na República Romana, os Municípios se caracterizam por agrupações de famílias, reunidas em uma circunscrição territorial, que gozam do direito de cidadania, tendo, em troca, a obrigação de pagar a Roma certos tributos e de servirem a seus exércitos. (1995, p.12)
Nessas cidades havia os homens livres, considerados cidadãos do Município (cives munícipes) e os estrangeiros (incolae), e somente os primeiros tinham direito a voto.
Estas cidades eram administradas por um colégio de dois a quatro magistrados que administravam a justiça (duumviri juridicundo ou quatuorviri juridicundo) e eram auxiliados por magistrados inferiores, encarregados administrativos e de polícia (aedilis).
Além desses, segundo Hely Lopes Meirelles, integravam o governo municipal, o encarregado da arrecadação (quaestor ou exactor), o encarregado da fiscalização dos negócios públicos (curator), o defensor da cidade ({defensor civitatis}, os notários (actuarii) e os escribas (scribal), que auxiliavam os magistrados. As leis locais (edictus) eram feitas por um Conselho Municipal (Cúria ou Ordo Decurionum) constituída por muitos cidadãos do Município (civis municipes), escolhidos periodicamente (duoviri quinquennales) e com funções parecidas com as do Senado Romano). (Meirelles, Hely Lopes,2001, p.34)
No ano de 494 a.C. é criada a figura dos magistrados plebeus (edis), auxiliados pelo Tribunal da Plebe na execução das sentenças, no ano de 366, foram criados os edis patrícios, que cuidavam da polícia da cidade, da higiene, da fiscalização dos pesos e medidas, o castigo dos infratores a seus éditos, as ações edilícias (redhibitoria e aestimatoria ou cuanti minoris) que servia como garantia dos vícios ocultos.
Os encarregados pela arrecadação (questor ou exator), eram os magistrados, que residiam em Roma e tinham o encargo de receber todo o dinheiro devido ao Estado, em virtude do pagamento das taxas, tributos,multas, indenizações de guerra, etc., para empregá-lo no custeio das obras públicos e manutenção dos serviços públicos.
As leis locais (edictus) continham ordens ou disposições dos magistrados e as regras de direito que deviam reger os municípios.
O édito, segundo Wolgran Junqueira Ferreira, era escrito em tábuas brancas de madeira, lidas publicamente e afixadas no Fórum e em outros lugares visíveis para dar conhecido ao povo. (1995b,p.14)
Julio César, através da Lex Julia Municipalis estendeu as colônias da Itália esse sistema de governo, e mais tarde, através das invasões, foi se estendendo as Províncias conquistadas da Grécia, Gália e Península Ibérica, e, por conseguinte, a França, Espanha e Portugal.
De 251 d.C a 271, período em que os godos e outros povos bárbaros invadiram o Império Romano, o regime municipal permaneceu intacto.
Consoante Hely Lopes Meirelles, “assim o regime municipal chegou à França, Espanha e Portugal, e paulatinamente se foi modificando, sob a dominação bárbara que se sucedeu à hegemonia romana”. (1985, p.26)
Mesmo sob o controle dos bárbaros a legislação romana não foi abalada, e o regime municipal permaneceu intacto durante o julgo do feudalismo, nos séculos XI e XII.
A emancipação das comunas na França, segundo Carneiro Maia apud Wolgran Junqueira Ferreira, não foi um ato espontâneo da realeza, “como pretende a maior parte dos historiadores, e lê-se no preâmbulo da Carta Francesa de 1814:“C’est ainsi que lês communes ont dù leur affranchissement à Louis de Gros.” (1995, p.15), pois foi gerada no seio das próprias comunas, causada pela liberdade oprimida, e por meios de ação e força e a riqueza de que já dispunham as cidades revoltadas sob a influência da burguesia e do clero das paróquias.
A realeza aproveitando-se da revolução iniciada pelo povo contra a tirania dos senhores interviu de forma a encaminhá-la no interesse próprio, no sentido de opor-se e abater o poder feudal, inimigo dos príncipes e das comunas.
Os reis passaram a outorgar as cartas comunais que emancipavam às comunas, mas em grande parte apenas homologavam as obtidas dos próprios senhores, algumas de forma espontânea, outras pela força ou pelo dinheiro.
A sanção real era uma garantia a mais contra os senhores, mas não deixava de ser uma forma de hostilizar o feudalismo em detrimento da Monarquia.
Wolgran Junqueira Ferreira, citando Augusto Thierry esclarece:

“Além disso, essas cartas, na maior parte, eram contratos celebrados entre o rei e as comunas onde aquele prometia imunidades, e estas se obrigavam à prestação de serviços militares, além de uma renda determinada, o que demonstra, primeiro: que os reis não faziam concessões gratuitas; segundo: que a forma sinalagmática dessas cartas, como as de Laon, St. Quentin, Soissons, e outras, integralmente publicadas por Guizot, indica que os próprios reis reconheciam nas comunas, certa individualidade política, ou independência de poder para estipularem condições recíprocas” (1995,p.15)

Como a realeza não tinha pretensão de fortalecer o Município, e sim de amparar a monarquia que oscilava entre a revolta popular e o feudalismo, na medida em que o poder feudal foi se enfraquecendo, essas concessões foram confiscadas.
A monarquia francesa na intenção de manter o poder real, foi retirando o poder das comunas, acabou por preparar a unidade nacional que foi perseguida pela Revolução de 1789.
O município na Espanha remonta do domínio imperial dos romanos, e propriamente de Júlio César que fundou algumas colônias e municípios.
Quando da invasão da península ibérica pelos bárbaros, houve a manutenção das instituições romanas e de seus costumes.
No Código de Alarico (Breviário e sua Interpretação) o governo municipal aparecia na forma de civicia, e os magistrados (duumviros e defensores) gozavam do privilégio de serem delegados e representantes da civicia, pois antes exerciam suas funções como uma espécie de direito pessoal.
Os visigodos tinham o Fuero Juzgo que praticamente abolia o direito romano, e criava um sistema dúplice de organização, parte eclesiástica e parte imperial, mas sem destruir os fatos sociais e a instituição municipal.
Mas com a derrota dos árabes, a monarquia gótica se restaurou e se fortaleceu, trazendo novos elementos à instituição municipal, que passou a possuir características próprias, crescendo de importância, na medida em que era constituída por homens livres que recebiam direitos e regalias, com o propósito de expulsarem os mouros.
A incorporação dos núcleos moçárabes ao novo regime, e a crescente concessão gradual de garantias e liberdades aos servos, distribuídas pelos condes e bispos, através das cartas forais, possibilitou o surgimento de comunidades denominadas conselhos.
A denominação conselho é encontrada durante parte da história política brasileira, mais precisamente até o advento do regime republicano.
A representação popular aparece no início do século XII, e, nas cortes de Castela e Aragão a primeira nobreza já figuravam os deputados (procuradores), formando o primeiro sistema representativo da história política da Espanha.
Em Portugal, o sistema municipal foi mantido pela necessidade de fixar seus limites com a Espanha, de organizar a sociedade, de obter o auxílio da burguesia contra as influências do clero e nobreza, durante o tempo necessário para fortalecer a realeza, e de obter uma fonte de recursos para manutenção da Monarquia Portuguesa, instalada em Lisboa em 1147 por Afonso Henriques.
Os sistemas de impostos tinham uma vasta nomenclatura: relegos, portagens, montados, talhas d’El-rei, quintos, açougagens, martinegas, ochavas, alcaidarias, almocrevarias, entre outras.
As cidades e vilas tinham direito de enviar dois homens bons (procuradores) as Cortes, que eram órgãos naturais para recebimento das queixas contra o rei e seus delegados. Alguns historiadores atribuem a essas Cortes caráter consultivo e outros deliberatório, moderando os poderes do rei, como um terceiro Estado.
Em 1385 as Cortes aclamaram o rei João I, e segundo Wolgran Junqueira Ferreira, lhe impuseram as seguintes condições: “a formar o seu conselho de cidadãos das principais cidades do reino escolhidos por proposta de listas tríplices; ouvir os povos em tudo o que fosse de seus interesses e não impor tributos, fazer a paz e a guerra sem o seu consentimento”. (1995c, p.18)
Na Idade Média o Conselho de Magistrado foi substituído pelo Colégio de Homens Livres, denominado Assembléia Pública de Vizinhos, com funções administrativa, policial e judicial.
A cobrança de tributos (monera) e a criação de cargos de alcaide, alvacis e almatáceis foram contribuições árabes na organização administrativa dos Municípios.
As atribuições edilícias da Antiguidade de caráter eminentemente administrativo transformaram-se nas funções político-administrativas do Município, que se estende, na atualidade, por todo o território do Município.
Da tradição Romana restaram os edis e da Idade Média os Conselhos dos Homens Livres, hoje transformados nas Câmaras de Vereadores, cujos membros são representantes da comunidade e fiscalizam o Poder Executivo Municipal.
Esta tradição se fixa em nosso modelo de organização e se desenvolve ao longo da história do Brasil, com importante contribuição para a nossa evolução político-administrativa. 

GUIMARÃES. Maria Elisabete Marcondes. O Município na História do Brasil. Disponível em: http://www.drabete.adv.br/index.php?option=com_content&view=article&id=9:o-municipio-na-historia-do-brasil&catid=4:textos&Itemid=5. Acesso em 22 out 2011.

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